Cartografia

As notícias acerca do Japão, antes da chegada dos Portugueses, eram escassas.

A primeira notícia da existência do Japão provém de Marco Polo (1254-1324) e a sua obra foi a base dos nossos conhecimentos sobre grande parte da Ásia até meados do século XVIII. A ilha do Japão era denominada por Marco Polo de Ciganpu, «Agora nos cheguemos a demostrar e decrarar as terras de Índia, e começarey em a ylha grande de Ciganpu. Esta ylha da parte do oriente he alonguada no alto mar da rybeyra de Mangy (grande China) per mill e quinhentas milhas e he muyto grande.», segundo nos informa Georg Schurhammer, na obra  Anais da Academia Portuguesa de História, Vol. 1, 2ª série, p. 33. Esta notícia do Japão foi divulgada na Europa nos fins da Idade Média.

Cristóvão Colombo, baseado nas informações de Marco Polo, teve a intenção de alcançar Ciganpu na sua primeira viagem, em 1492.

A palavra Japão foi, pela primeira vez, usada, na Europa, por Tomé Pires, na sua Suma Oriental, obra escrita em Malaca, que terminou em Janeiro de 1514, «A Ilha de Jampon, segundo todos os Chijs dizem, que he moor que a dos Lequios e o rey mais poderoso e maior e nom he dado à mercadoria nem seus naturais. [...] Tratam na China poucas vezes por ser longe e elles nom tem naaos nem serem homens do maar.», in: Anais da Academia Portuguesa de História, segundo Georg Schurhammer, Vol. 1, 2ª série, p. 81.

Duarte Barbosa também fez referência ao Japão na sua obra Discrição, «Defronte desta grande terra da China vão muytas ilhas ao mar, alem das quaes vay hua terra mui grande que dizem que hé firme...» in: La Compagnie de Jesus et Le Japon, de Léon Bourdoy, p. 111.

O Japão já tinha sido representado, no século XV, como sendo uma grande ilha rectangular no Insularium Ilustratum do alemão Henricus Martellus, de cerca de 1490 e no globo do alemão Martin Behaim, de 1492, mas nestes mapas não aparece o nome Japão.

Após a chegada dos Portugueses ao Japão, durante um período de cerca de cem anos, «...desenvolveu-se um intercâmbio económico e cultural entre...» Japoneses e Portugueses, segundo Alfredo Pinheiro Marques, na sua obra A Cartografia dos Descobrimentos, p. 63.

O encontro entre Portugueses e Japoneses deixou marcas na cartografia, porque os Portugueses começaram a dar a conhecer o Japã a todo o Mundo.

Os cartógrafos Portugueses recolheram informações acerca do Japão no Oriente e, antes dos Portugueses chegarem ao Japão, homens como Francisco Rodrigues, Pedro Reinel e Lopo Homem já tinham representado o Japão na cartografia portuguesa, sob a influência de Marco Polo, que concebeu a ilha como sendo rectangular.

Segundo Armando Cortesão, a primeira representação efectiva do Japão data de 1550, vem num mapa anónimo português e neste mapa também aparece, pela primeira vez, o nome Japão. Este mapa está conservado na Biblioteca Vallicelliana, em Itália.Primeira representação efectiva do japão

Mapa 1 -Anónimo, Planisfério,c.1550, Biblioteca Vallicelliana, Roma (MARQUES, 1994: 95)

 

 

O primeiro protótipo que surgiu na cartografia portuguesa foi o «tipo Lopo Homem», segundo Alfredo Pinheiro Marques, na sua obra a Cartografia Portuguesa do Japão (séculos XVI- XVII), surgindo no planisfério de Lopo Homem de 1554 e este protótipo foi bastante reproduzido em mapas.

 

                   

Mapa 2 - Lopo Homem, Planisfério, 1554, Instituto e Museo di Storia della Scienza, Firenze ( MARQUES, 1994: 97)

Na década de 60 do século XVI, Bartolomeu Velho representou as ilhas japonesas numa série de mapas, tendo melhorado em orientação e pormenor relativamente a Lopo Homem. Este protótipo «tipo Bartolomeu Velho» não teve grande popularidade, mas tinha uma grande novidade, o facto de as ilhas se apresentarem no sentido Norte-Sul. Bartolomeu Velho «...apresentou as ilhas com abundante toponímia [...] escreveu várias vezes o topónimo minas de prata...», p. 21, in: Cartografia Portuguesa do Japão (séculos XVI- XVII), de Alfredo Pinheiro Marques, o que demonstra o interesse económico dos Portugueses nessas regiões, porque nessa altura tinha-se descoberto a mineração da prata.

                                   

Mapa 3 -Anónimo - Bartolomeu Velho, Carta do Pacífico Ocidental, in Atlas Universal, c.1560, Huntington Library, San Marino, Califórnia ( MARQUES, 1994: 111)

 

Na mesma época do protótipo «tipo Bartolomeu Velho», desenvolveu-se na cartografia portuguesa um tipo de representação «...sob a forma de uma lua em crescente com os extremos virados para sul», p. 22 in: Cartografia Portuguesa do Japão (séculos XVI- XVII), de Alfredo Pinheiro Marques. Esta representação surge pela primeira vez na carta do mundo em projecção polar que vem no Atlas português anónimo que acompanha o Livro de Marinharia, de João de Lisboa, de cerca de 1560. Este protótipo é designado de «tipo Vaz Dourado» e teve uma enorme influência na cartografia de Portugal e da Europa.

                     

Mapa 4 - Anónimo, Planisfério em projecção polar, in Atlas Universal com 20 cartas (in Livro de Marinharia de João de Lisboa),c.1560, Arquivo histórico do Ministério das Finanças, Lisboa (MARQUES, 1994: 113)

 

 

 

 

 

 

 

Mapa 5 - Fernão Vaz Dourado, Carta do Japão, in Atlas Universal com 14 cartas e 5 folhas com elementos cosmográficos, 1568, Fundacion Casa de Alba, Madrid (MARQUES, 1994:139)

 

Na década de 90 do século XVI desenvolveu-se o protótipo denominado «tipo Luís Teixeira», este já com traçados mais correctos e com o nome de quem o introduziu. A representação do Japão tinha evoluído muito e este modelo «tipo Luís Teixeira» teve uma enorme proliferação.

Luís Teixeira recolheu informações do Japão através da Companhia de Jesus e dessa forma teve acesso a fontes japonesas. Foi esta troca de informações luso-nipónicas que permitiu o amadurecimento da representação cartográfica do Japão. Neste processo de desenvolvimento da cartografia também foram importantes os conhecimentos que os Japoneses adquiriram sobre as técnicas da cartografia europeia, através de Jesuítas e de pilotos portugueses que faziam viagens entre Macau e Nagasáqui.

 

 

Mapa 6 - Luís Teixeira, carta do Japão, gravada in Theatrum Orbis Terrarum de Abraham Ortelius (ed.1595), 1595 (MARQUES, 1994: 171)

 

 

João Teixeira Albernaz I, filho de Luís Teixeira, levou o modelo «tipo Luís Teixeira» ao apogeu com a introdução de algumas alterações. Ele incluiu no seu atlas uma carta especial dedicada ao pacífico Norte, com as latitudes onde se situa o Japão.

 

Mapa 7 - Anónimo - João Teixeira Albernaz I, Carta da China e do Japão, in Atlas Universal com 20 cartas («Duchesse de Berry»), c.1628, Bibliothèque Nationale, Paris (MARQUES, 1994: 201)

 

Outra «escola» contemporânea da dos Teixeira foi a dos Sanches, mas a dos Teixeira é mais minuciosa quanto ao pormenor, porque, por exemplo, a «escola» dos Sanches não representava a ilha Iezo separada.

Mapa 8 - António Sanches, Planisfério, 1623, British Library, London [pormenor] (MARQUES, 1994: 197)

 

A partir de 1614 os traçados cartográficos do Japão ainda se aperfeiçoaram mais, porque os Portugueses tinham acesso a novas informações das regiões nipónicas setentrionais, através de Sebastian Vizcaino, que esteve no Japão de 1611 a 1613. O modelo popularizado por este cartógrafo representava as ilhas de Bungo, Tonça, Meaco e Iezo, esta última separada e circular.

O Japão estava a ganhar uma enorme importância na cartografia portuguesa, quando as suas relações com Portugal estavam a ser dificultadas.

De 1706, temos um Planisfério de José da Costa Miranda e a representação que ele faz do Japão é diferente da representação do «tipo Luís Teixeira» e menos aperfeiçoada. Nesta altura, a presença portuguesa no Oriente e a cartografia portuguesa estavam em decadência.

 

Mapa 9 - José da Costa Miranda, Planisfério, 1706, The Mitchel Library - Public Library of New South Wales, Sidney (MARQUES, 1994: 243)

 

No entanto, apesar das melhorias introduzidas pela cartografia portuguesa na representação do Japão, os Japoneses atribuíam o desenvolvimento da sua cartografia aos Holandeses.

Contudo, a cartografia portuguesa foi rapidamente aprendida pelos Japoneses e «Este intercâmbio cartográfico luso-japonês é [...] um dos campos mais interessantes do Encontro Civilizacional entre as duas nações de Oriente e Ocidente...», segundo Alfredo Pinheiro Marques, na sua obra Cartografia Portuguesa do Japão (séculos XVI- XVII), p. 34.Par de biombos

Fig.1 -Par de biombos com mapa - múndi e imagens de Lisboa, Roma, Sevilha, Constantinopla e Japão, início do século XVII (BETHENCOURT, 1997:  556 e 557)

As técnicas da cartografia náutica portuguesa estiveram na origem do desenvolvimento da moderna cartografia japonesa e essa influência pode-se verificar no uso de algumas palavras, como por exemplo: “kuwadarante – quadrante” e “kompasu – compasso”, entre outras.

A ciência cartográfica foi um método de divulgação do Cristianismo, através da cartografia e da astronomia. Esta ciência foi aliada à arte, porque os Japoneses fizeram biombos cartográficos, exemplo disso é a representação do mapa-múndi. Nestes mapas aparece uma inter-relação de aprendizagem de duas ciências: a astronomia e a geografia. Os mapa-múndi também aparecem acompanhados por imagens representando os quatro continentes, estrangeiros de diversas regiões e/ou vistas de cidades. Nos finais do século XVII surgiram biombos dedicados inteiramente à representação de cidades japonesas, com especial destaque para Nagasáqui, centro de comércio.